[RESENHA] Jogador Número Dois



Chegou a hora de falar dele. Com alguns meses parado na estante enquanto ia passando outras leituras na frente, Jogador Número Dois ganhou a sua vez e hoje estou aqui para falar um pouco sobre a experiência de leitura da continuação do excelente Jogador Número Um.

Dias após o fim do concurso lançado pelo fundador do OASIS, Wade Watts faz uma descoberta bombástica. Escondida no cofre de James Halliday, há uma tecnologia capaz de alterar a natureza da existência humana para sempre — e talvez piorar ainda mais as coisas.

Chamado de Interface Neural OASIS, ou INO, o dispositivo permite que o usuário use os cinco sentidos no ambiente virtual e controle seu avatar apenas com o pensamento. Também é possível gravar suas experiências no mundo real e que outras pessoas consigam revivê-las. Ainda que revolucionário, o INO torna o OASIS mais viciante e perigoso do que nunca.

Começa assim uma nova missão, uma caça ao último Easter egg deixado por Halliday, com um misterioso prêmio em vista. Ao longo dessa jornada, Wade e seus amigos enfrentarão um inimigo inesperado e extremamente poderoso — disposto a matar milhões para conseguir o que quer —, revelações do passado conturbado de Halliday e até mesmo múltiplas versões do cantor Prince. A vida de Wade e o futuro do OASIS estão em risco outra vez, mas a humanidade pode ser a maior vítima dessa guerra cada vez mais real.

A necessidade de uma continuação para o maior sucesso de Ernest Cline foi bem debatida quando Jogador Número Dois foi anunciado, afinal, o primeiro livro encerra de forma bem fechada e com pouco espaço para uma continuação. Mas ela veio, e veio jogando por terra tudo o que já estava bem estabelecido, principalmente em relação aos seus personagens.



O livro começa pouquíssimo tempo após Wade conseguir encontrar o Easter Egg de Haliday e tornar-se dono do OASIS junto de seus amigos Art3mis, Aech e Shoto. Ele descobre uma nova frase no Easter Egg que o leva à descoberta de uma nova tecnologia capaz de mudar para sempre a experiência dentro do OASIS e, acima de tudo, a forma com que a humanidade lida com as diferenças entre o real e o virtual.

Com a INO (Interface Neural OASIS), todos os jogadores poderão controlar seus avatares através da mente, com algumas limitações, uma vez que o poder de causar vício torna-se ainda maior, além de que o uso indiscriminado poderia levar a danos sérios no cérebro, além de mortes. Cabia a Wade engavetar o projeto ou liberar isso para o mundo. Óbvio que ele escolhe a segunda opção e com isso desencadeia um novo e misterioso desafio criado por Haliday e sua mente doente.



Jogador Número Dois é uma completa bagunça. A justificativa para um segundo livro já não é das mais convincentes, considerando a forma em que é desencadeada. E bastam os dois capítulos de prólogo pra ele ir descontruindo completamente seu protagonista. Wade pode não ser o cara mais certinho, equilibrado e interessante de se acompanhar, mas o que temos aqui não é sombra do que ele já foi. Ele não teria conseguido fazer absolutamente NADA sozinho. E com isso abrem-se espaços para diversas conveniências para fazer a trama andar.

Não é mais o personagem inteligente que conhecíamos e é até capaz de atitudes bem questionáveis uma vez que tem o poder nas mãos. Podem colocar na conta invasão de privacidade, matar avatares de haters e por aí vai.

A obra também demora muito a nos levar para algum lugar. Ali pela página 180 é o que podemos chamar de verdadeiro início da narrativa. Até esse ponto, muita repetição, excesso de referências que dessa vez não despertam nostalgia alguma. Eu até agora me pergunto o porque de ser necessário falar que a casa de Og foi construída para lembrar Valfenda de Senhor dos Anéis, TODAS as vezes em que ela era mencionada.

O vilão é muito mais do que clichê (e causa um pouquinho de vergonha alheia), os personagens são pouco interessantes, os desafios igualmente chatos, em um livro onde "urgência" é uma premissa, não existe qualquer senso disso, em momento algum. Jogador Número Dois é quase vazio de qualquer emoção.



Quase vazio. Felizmente Ernest Cline consegue encontrar espaço para nos emocionar com Wade, quando ele vai a um local que lembra de sua mãe. Provavelmente o momento mais tocante do personagens nos dois livros.

E o maior ponto positivo fica para a presença ainda mais forte de Kira, ex-mulher de Og e que é uma das grandes responsáveis pela criação do OASIS, ainda que não recebesse o devido crédito por isso. Kira é o centro de tudo nesse livro. Quem ela foi, seu amor por Og e a obsessão de Haliday por ela, movem a trama. É uma pena que seja tão ofuscada pelos defeitos do livro.

E o final! Eu estou até agora tentando processar se o autor realmente achou que isso seria interessante e se toda a inteligência que ainda restava nos personagens foi pro ralo com a decisão que eles tomaram.

A ideia é até boa e o livro "consegue" novamente trazer as discussões dessa divisão entre o real e o virtual, e como o virtual está cada vez mais tomando conta das nossas vidas. Mas a execução dessa ideia é sem emoção alguma, jogada de qualquer jeito e acabando com seus próprios personagens. Jogador Número Dois é um livro ruim que tinha todo o potencial para ser muito bom.

Que venha o segundo filme, que bem sabemos que é o real motivo para esse livro existir. E que não tenha um Número Três, por favor!

Autor: Ernest Cline | Editora: Intrínseca | Páginas: 416 | Ano: 2021 | Tradução: Giu Aloso e Flora Pinheiro

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